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Em um mês onde a saúde mental ganha maior destaque devido à campanha nacional do Setembro Amarelo, é oportunidade das empresas, líderes e empregados aproveitarem para discutir temas relacionados, incluindo também a Síndrome de Burnout, doença já reconhecida como ocupacional.
O ambiente de trabalho pode ser cansativo, desgastante e até possivelmente “tóxico”, por isso já existem campanhas para ajudar na preservação da segurança psicológica neste ambiente, como é o caso do movimento “EPIs da saúde mental”, criado pela jornalista Izabella Camargo, que ajudou a popularizar a doença burnout no Brasil em 2018.
Esses “EPIs da saúde mental” são equipamentos que vão definir limites para proteger a saúde mental, assim como existem limites para proteger riscos físicos.
“Hoje já temos números de perdas humanas e financeiras sobre os impactos da falta de saúde mental", diz Camargo. "Quando olhei o histórico dos EPIs industriais, vi que demoramos quase 40 anos para ter normas regulamentadoras para proteger pessoas de riscos físicos, como capacete, luvas e óculos; foi aí que pensei em recursos que podem definir limites para a saúde mental”.
Entre os EPIs que podem ajudar psicologicamente os funcionários, no âmbito corporativo Camargo destaca o letramento da liderança, direito à desconexão e à flexibilidade. No âmbito individual, ela reforça a autorresponsabilidade, terapias e a educação financeira.
“Esse conteúdo foi construído com base em trocas de experiências entre empresas que buscam prevenir os problemas ocupacionais, e o burnout é um deles”, diz a jornalista. “Precisamos falar sobre os direitos e deveres dos dois lados, tanto dos liderados quanto das companhias, afinal, um ambiente tóxico pode ser formado por diferentes agentes”.
A jornalista identificou sintomas do burnout como manchas na pele, alergia, queda de cabelo, dor de estômago e até problemas no intestino. “Foram sintomas que só fui entender depois de muito tempo e de várias consultas com especialistas", afirma a jornalista.
Além desses sintomas aparentes, Camargo também começou a sentir taquicardia e perda da funcionalidade.
“Cheguei a tomar remédios para dar conta da rotina, como remédio para dormir, acordar e performar”, diz a jornalista. “Fiquei um tempo sem poder dirigir e perdi a capacidade de compreender textos. Minha capacidade cognitiva foi abalada momentaneamente”.
Esses sintomas, segundo ela, são manifestações físicas do estresse crônico, que se diferencia do estresse agudo, comum e necessário para a evolução humana. "O estresse agudo é aquela situação que você vive e supera, como um desafio pontual. Já o estresse crônico é aquele que você enfrenta diariamente para sobreviver, com descargas constantes de cortisol que não deveriam ocorrer todos os dias", diz.
O problema do burnout não está necessariamente no trabalho em si, afirma Camargo, mas no assédio que muitas vezes ocorre no ambiente profissional. "Assim como normalizamos dores pelo corpo, também normalizamos o assédio moral", afirma.
Entre as principais humilhações que podem existir no ambiente de trabalho por causa do assédio moral, Camargo lembra de alguns exemplos que já foram destacados por Luciana Veloso Baruki, executiva brasileira conhecida por sua atuação no setor empresarial, especialmente na área de gestão e liderança:
Desqualificação profissional: a pessoa passa a sofrer críticas constantes e depreciativas que minam a sua autoestima e a sua autoconfiança. “Pode ser presencial, por telefone ou até e-mail, é uma forma de ataque psicológico repetitivo, seja qual for o meio”, diz Camargo.
Sobrecarga de trabalho: imposição de tarefas excessivas ou prazos impossíveis. Essa estratégia geralmente é usada para pressionar e desestabilizar o profissional, porque cria um ambiente de estresse constante. “E muitas pessoas até escutam ‘se você não fizer, tem uma fila querendo seu lugar’, como uma forma de pressionar mesmo”, diz a jornalista.
Isolamento ou exclusão social: a pessoa é excluída de interações sociais e profissionais. Isso acaba gerando sentimento de rejeição e inferioridade e afeta profundamente a saúde mental.
Violência verbal: é rara, mas acontece muito ainda, como gritos, insultos e apelidos pejorativos que intimidam e humilham a pessoa. Piadinhas sobre ela estar tentando estabelecer limites no trabalho pode criar um ambiente hostil e degradante.
Humilhações públicas: exposição pública de erros ou críticas em frente a colegas, com o objetivo de envergonhar e diminuir a pessoa. A liderança que faz isso quer expor o funcionário. Isso traz danos emocionais sérios.
O processo de normalização do burnout, segundo a jornalista, é comum em profissões de alta demanda. “Escuto muitos médicos e professores falando sobre a doença. Normalmente, são profissões onde há hierarquia e a cobrança é constante, tudo que podem gerar um ambiente de desgaste extremo”, diz Camargo.
Existe uma contradição, segundo Camargo, entre a síndrome da impostora (condição em que as pessoas duvidam de sua capacidade intelectual), e o excesso de confiança na capacidade física (mesmo quando o corpo já dá sinais de exaustão, como burnout).
“O excesso de confiança é um perigo, você precisa ter condições de se autoavaliar. Eu mesma ouvia sobre o burnout e não enxergava o problema em mim”, diz Camargo.
Para Camargo, a principal causa de burnout hoje não está mais na falta de informação, mas na não capacidade de comunicação entre o líder e o liderado. “É preciso saber se comunicar, precisamos reconhecer e promover a importância da inteligência emocional”.
Apesar deste mês ser marcado pelo movimento Setembro Amarelo, que foca na prevenção ao suicídio, os números por si só não ajudam a prevenir, afirma Camargo. “O que realmente faz a diferença é o letramento das emoções”. Segundo a jornalista, quem tenta o suicídio não deseja se livrar da vida, mas sim de uma dor invisível, que muitas vezes não é compreendida pelos outros.
Para ajudar alguém a encontrar uma saída para essa dor, Camargo reforça que é essencial oferecer apoio e informação. O Centro de Valorização da Vida (CVV), por exemplo, desempenha um papel crucial ao fornecer um canal de comunicação gratuito e acessível a todos. “Falar e buscar ajuda é a forma que a gente promove a vida”, diz Camargo.
Uma armadilha que muitas vezes leva ao burnout é amar demais o trabalho. "As pessoas precisam conhecer a ‘armadilha da competência’, que é quando você é remunerado com mais trabalho. Isso pode fazer você se sentir prestigiada, mas é também o caminho para o esgotamento", conta a jornalista.
Para evitar o burnout a solução está em reconhecer os sinais e tratá-lo. Após receber o diagnóstico de burnout, Camargo se viu diante de uma realidade sem cura, mas com possibilidades de tratamento e possibilidade de recaídas.
"É como qualquer vício. Se você coloca uma pessoa que já teve problemas com bebida em um ambiente com muita bebida, ela pode recair. O mesmo acontece com o burnout", afirma.
Um dos passos fundamentais para a recuperação, segundo Camargo, é assumir o controle de sua própria agenda. "Quando você é dona da sua agenda, a responsabilidade de estabelecer limites é sua. Se você não consegue estabelecer esses limites, vai adoecer novamente", diz.
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